Mudanças, adaptações e flexibilidade foram algumas das palavras-chave que marcaram os dois últimos anos, quando todos os setores da sociedade tiveram que se mobilizar, em busca de alternativas que pudessem sustentar um cenário novo e criar condições para superar os momentos de restrições impostos durante a pandemia.

Nas IES (Instituições de Educação Superior), o desafio tinha outros parâmetros, fora da alçada da Educação. Era preciso criar estratégias eficazes para a disseminação do conhecimento, mas também vencer uma séria limitação do ensino a distância: a difícil e, às vezes inexistente, acessibilidade tecnológica de milhares de estudantes, uma realidade presente em todo o país, mas que se escancarou neste período.

O que se aprendeu com este cenário e qual legado as IES vão levar para os próximos anos? A resposta não é simples, pois ainda há muito a se fazer. 

Para Rose Giacomin, Coordenadora Acadêmica Nacional dos cursos de Direito da Kroton-Cogna e Avaliadora de Cursos Jurídicos INEP, Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Educação em Minas Gerais, fomos vítimas de um inimigo invisível, que causou impacto mundial e deixou o planeta doente, sem saber qual o medicamento para nos curarmos. E, diante desta perplexidade, a transformação digital aconteceu e potencializou a Educação, ao se revelar como um verdadeiro pilar na construção do futuro. Esta e outras reflexões estão nesta entrevista exclusiva, que concedeu ao Blog da Minha Biblioteca.

MB – Como você acredita que as IES estão projetando o futuro, pensando nas possíveis perdas e aprendizagens, com quase dois anos de tantas transformações na Educação?

Rose – Quando analisamos a linha do tempo desses dois anos, tenho o coração aquecido – em um momento de muitas incertezas. Mas, além de sobreviventes, atualmente contamos com extrema evolução positiva e com esperança.

Foram várias respostas às mudanças de comportamento do nosso perfil de atuação. A internet, por meio do computador e dos aplicativos, substituiu os deslocamentos e ficamos em isolamento social, através da quebra de paradigmas, desde a simples forma de pedir comida no delivery, ao nosso relacionamento pessoal com amigos e familiares. 

No caso dos cursos de Direito, por exemplo, contam, em sua maioria, com o formato presencial e, se a Instituição de Ensino Superior atuava 100% neste modelo, a virada de chave que ocorreu em março de 2020 foi mais espinhosa.

Vale lembrar que, a partir desta data, se criou um senso de urgência sobre transformação digital, acelerando em alguns casos ou completando outros, com iniciativas acadêmicas que antes encontravam resistência.

Conquistamos uma nova forma de estudo e trabalho. Nunca tivemos tão conectados, para alguns de forma forçada. Mas é inevitável afirmar que superamos barreiras ao nos tornarmos sobreviventes. Considero a transformação digital o ensino a distância como o principal legado da crise.

Nesta esteira, quando tratamos da pauta das possíveis perdas no aprendizado, em um processo cognitivo de um conteúdo na educação, a análise é ampla diante de tantas competências que foram absorvidas ou conquistadas durante o percurso do ensino superior.


“As IES, representadas por suas comunidades acadêmicas, estão sendo incansáveis ao promoverem iniciativas, em uma pluralidade de ideias. Merecem os nossos aplausos, mas vale entender o que isso significa para o futuro e deixo esse ponto reflexivo”.


MB – Reinvenção de estratégias e adequação foram os nortes para as IES sobreviverem a tantas mudanças? 

Rose – A pandemia confirmou nossa convicção de que o ensino digital é uma tendência que deve se consolidar na educação brasileira e apenas acelerou o processo de digitalização do setor, exigindo uma capacidade de resposta operacional muito mais rápida. O mercado de educação a distância cresceu 4,7 vezes, nos últimos 10 anos, segundo dados do INEP.  Para a Kroton, a pandemia foi apenas um catalisador da digitalização do ensino que já estava em curso, pois a transformação digital já era algo presente na empresa, desde 2017.  Somos pioneiros no EAD, com a marca UNOPAR, e líder neste mercado no Brasil.

A capacidade de se adaptar ocorre de forma diferente e em diversos cenários, quando analisamos o caso concreto de determinada IES. Em uma visão espacial das mudanças no formato presencial, todas tiveram que modelar novas estratégias para se manterem firmes no mercado de educação.

Na fase inicial do isolamento social, por exemplo, se tornou inevitável e todas as escolas e faculdades tiveram mudanças em suas rotinas. Sem deixar a margem que, por essência, somos seres sociais. A instituição de ensino superior também conta com uma característica socioemocional e o ser humano só aprende a socializar com a convivência. Daí a premissa de que a maioria dos professores e estudantes prefere o ensino presencial.

Surgiram novas oportunidades, diminuíram as barreiras e se potencializou a educação, criando um ressignificado e mudanças de estratégias nas IES, que ganharam um outro protagonismo, neste processo de descoberta do nosso “novo normal”.

Para o docente, que só atuava de forma presencial e não tinha experiência em lecionar diante das câmeras, num recorte para o ensino superior, podemos afirmar que já a adquiriu. E, através de uma plataforma de transmissão ao vivo, lecionou ou ainda leciona no formato assíncrono. Nós não paramos e, além de realizar o acolhimento, fomos a esperança. Contamos com a mudança de demanda por habilidades e das competências socioemocionais, papeis que vieram para ficar: adaptabilidade, resiliência e criatividade, numa comunidade acadêmica sempre ativa.

MB – Dizem que a tecnologia foi o caminho para aproximar discentes e docentes e não deixar a aprendizagem sair dos trilhos, em 2020 e 2021. Você compartilha da mesma opinião? 

Rose – Sabemos que o professor utiliza nas aulas expositivas presenciais uma linguagem corporal e uma comunicação não verbal e, antes da pandemia, dominava as técnicas do ambiente de uma sala de aula tradicional.

Distante desta convivência, as interações com os estudantes ganharam novo contorno. O ponto focal era conquistar a atenção em um silêncio de sala de aula no formato online, com as câmeras fechadas, o que sempre foi e será um desafio. Mas tentamos superar barreiras para realizarmos a melhor entrega, ao transformar a vida das pessoas através da Educação. 

Um docente, quando utiliza a tecnologia no formato assíncrono para a transmissão ao vivo, conta com outra percepção dos sentidos para motivar os seus estudantes, independentemente da disciplina. A modelagem da sua aula expositiva e a apresentação do conteúdo programático, são totalmente diferentes. 

A origem da minha formação profissional é na área de Informática e aconteceu durante anos na docência. Por isso, com mais de duas décadas na Educação, afirmo, sem medo de errar, que a tecnologia, a partir de 2020, foi o caminho para aproximar os professores de seus estudantes.

Atualmente, o ensino remoto gerou uma grande oportunidade e teremos novas habilidades do profissional do futuro. Milhares de pessoas precisam passar por um processo de treinamento e requalificação. E, com a transformação digital, contamos com várias ferramentas para promover a aprendizagem de forma plena.

O know-how em tecnologia permitiu à Kroton superar rapidamente os desafios impostos pela pandemia. Com esse conhecimento, implementamos a virtualização das atividades práticas, como por exemplo, laboratórios da área da saúde, química, engenharia, física e biologia, com recursos e representações gráficas para transpor a experiência física para o digital. Respeitando integralmente as normativas do Ministério da Educação e as especificidades dos cursos, elaboramos planos adaptados para que os estudantes pudessem cumprir seus estágios curriculares obrigatórios e seguirem rumo a sua formação profissional. Já para os discentes que estavam fechando o seu ciclo de formação, realizamos a colação de grau digital, tanto para os dos cursos presenciais, quanto dos digitais, através do Portal do Aluno.

MB – Neste contexto, a acessibilidade aos recursos tecnológicos sempre esteve em pauta, mesmo que uma simples conexão à internet. Este tipo de dificuldade básica é o real retrato da Educação no País?  O que falta para melhorar este cenário?

Rose – Trata-se de uma reflexão extremamente atual e necessária. Um dos efeitos da pandemia foi o de evidenciar as desigualdades sociais em nosso país e, mesmo dentro de uma mesma IES, existe essa diferença. 

Tivemos uma lupa para essa dor e, apesar de não ser um fato novo, a acessibilidade aos recursos tecnológicos ainda é uma dificuldade para muitos brasileiros e está inerente aos desafios do nosso país, infelizmente.

Não podemos analisar o cenário da Educação sem o contraponto com a nossa economia, a atuação do poder público e da iniciativa privada. Com destaque especial que mais de um milhão de empresas já fecharam as portas e quase 15 milhões de pessoas encontram-se desempregadas. 

É certo que forças internas e externas estão provocando disrupções sem precedentes e não tenho o parecer definitivo para melhorar de forma imediata. Assim, não é uma solução isolada. Precisaremos unir forças entre o poder público, iniciativa privada, terceiro setor e a sociedade. 

MB – E qual o papel da Minha Biblioteca neste cenário? 

Rose – Para o formato remoto da atuação do docente, considero importantes alguns pilares elementares, como a utilização de ferramentas digitais, o planejamento da aula, cenário, a modelagem do tempo de explicação – que é diferente das aulas presenciais – a escuta efetiva, o estímulo e percepção, para o envolvimento de todos os estudantes na transmissão ao vivo; sempre com o incentivo à leitura através do conteúdo programático editorial, para atividades extraclasse, antes e pós-aula. 

O armazenamento de arquivos nos últimos tempos, por exemplo, passou por uma transformação digital intensa. Na área de Educação do Professor 1.0, com o quadro verde e o giz branco, ele atualizava seu conhecimento através dos livros físicos. Hoje, conta com um acervo digital incrível, em diversas áreas do saber, na plataforma. 

Saímos do armazenamento em discos flexíveis (5 ¼ e 3 ½) para o pen drive, até chegarmos no formato em nuvem; do retroprojetor e lâminas, para o Datashow e apresentações com recursos multimídia; do ensino superior presencial tradicional em sala de aula, para vivenciar a sala de aula virtual e do livro físico – nem sempre atualizado-, para centenas de obras digitais atualizadas.

Neste cenário, o curso de Direito é especial porque estamos condenados à leitura eterna, fazendo com que estejamos atentos a cada nova edição, pelas constantes atualizações legislativas. Esta conduta é o diferencial para o estudante e profissional de sucesso. 

Do isolamento ao distanciamento social, para muitos, o acesso ao acervo físico, disponível na biblioteca tradicional, não foi possível. Mas, um rico acervo editorial digital tornou viável ampliar o conhecimento e somar nesta fase, sem a interrupção dos estudos.

Faço parte deste diagnóstico, ao utilizar com frequência as obras da plataforma e não tive nenhuma dificuldade, graças ao acesso para a produção de conteúdo e preparação das minhas aulas. Nossa comunidade acadêmica e expediente editorial também não pararam e estão em pleno vigor.

Com todos os desafios enfrentados neste período, destaco com pincel fluorescente, a importância da Minha Biblioteca, ao proporcionar estudo contínuo e diário, sem o estudante sair de casa, e, também, sua aplicabilidade nos cursos presenciais. Inspirada no escritor Jorge Luis Borges, ressalto que “sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de livraria”. É assim que visualizo a plataforma, o meu paraíso.

MB – Quais caminhos apontaria como tendências para as IES, na próxima década? Recursos tecnológicas irão conduzir as metas do ensino-aprendizagem?

Rose – As soluções acadêmicas, que abraçam a inovação, são a principal tendência. Em uma pandemia sem precedentes, todos nós ainda estamos aprendendo e, de forma contínua, construindo ou reinventando essa transição, na sociedade – em uma visão global – e no nosso contexto, que envolve a comunidade acadêmica, os gestores, professores e estudantes.

Acredito que o caminho seja aproveitar as grandes oportunidades e não repetir o modelo tradicional. O ensino híbrido é uma realidade que veio para ficar, ao trazer o equilíbrio entre as duas modalidades. Nesta esteira, contamos também com as plataformas adaptativas, para nivelamento da turma heterogênea, metodologias ativas e um novo perfil de usuários, com qualificação tecnológica.

Unificar a plataforma que será utilizada pela IES, no formato síncrono, é um pontapé inicial. Se o docente escolher essa fase, poderá gerar dificuldades aos estudantes ao navegar em uma aula no Hangout Meet, em outro momento no Zoom, Teams, Webex da Cisco, Amazon, dentre tantas possibilidades.

Para o formato assíncrono, a instituição que ofertava o curso apenas presencial, possivelmente já realizou investimento em uma Plataforma de Aprendizagem. O ponto de atenção são os recursos tecnológicos e será necessária atualização dos tutores, equipe de apoio multidisciplinar e gestão eficiente ao impulsionar atividades, vídeos, material de apoio, hospedagem das aulas, comunicação, dentre uma ampla gama de recursos disponíveis.


“O ensino híbrido é uma realidade que veio para ficar, ao trazer o equilíbrio entre as duas modalidades”


MB – Você citou o Direito, quais as diretrizes para o futuro do curso, incluindo a modalidade EAD? Há diferenças muito claras nestes dois universos, quando se pensa em metodologias de ensino e resultados de aproveitamento? 

Rose – O curso de Direito recepcionou uma nova Diretriz Curricular Nacional (DCN) com a entrada em vigor da Resolução CNE/ CES nº 5/2018 e, recentemente, a atualização com a Resolução CNE/ CES nº 2/2021. Com efeito normativo imediato para os novos cursos de autorização (presencial ou EAD) e, em 2022, para os cursos que estão em andamento; para fins de regulatório e visita do MEC no credenciamento e recredenciamento das IES.

As diretrizes destacam a importância do ensino jurídico em seus eixos integradores de inovação e qualidade no curso de Direito. A tríade da Educação ganhou destaque no bacharelado do Direito através do ensino, pesquisa, extensão, inovação – das novas tecnologias da informação – convivência e prática. 

A nova DCN, em sua interdisciplinaridade e a articulação de saberes, prevê conteúdos e atividades que atendam perspectivas formativas: Formação geral, Formação técnico-jurídica e Formação prático-profissional. Abrangendo estudos referentes ao letramento digital, práticas remotas mediadas por tecnologias de informação e comunicação (Resolução CNE/ CES nº 5/2018).

Avaliando o Direito Digital (Cibernético) às Formas Consensuais de Solução de Conflitos, para um curso tradicional como o Direito, os drivers integradores de qualidade estão claros e extremamente atuais, tendo em vista o número de processos que tramitam nos Tribunais de Justiça, ao proporcionar as atividades de caráter prático-profissional, e a ênfase na resolução de problemas de modo transversal, em todas as três perspectivas formativas (Resolução CNE/ CES nº 2/2021).

Neste contexto, as metodologias ativas podem e devem ser utilizadas nas perspectivas formativas do graduando ao egresso das Instituições de Educação Superior, “considerados os domínios estruturantes necessários à formação jurídica, aos problemas emergentes e transdisciplinares e aos novos desafios de ensino e pesquisa que se estabeleçam para a formação pretendida”  (Resolução CNE/ CES nº 2/2021).

MB – Num cenário tão inesperado, como você avalia a mobilização das pessoas e empresas para superarem este momento? 

Rose – Meus olhos brilham com os atos de solidariedade de vários atores, que causaram impacto social extremamente relevante, neste período, ao minimizar essa dificuldade básica, proporcionando conteúdo e acesso aos que mais necessitavam. Também realizamos ações, projetos e iniciativas. Oferecemos capacitação profissionalizante e empreendedora gratuita e aberta para todos, mesmo aos que não tinham vínculo com a instituição. Em 2020, foram mais de 60 cursos com certificação, que beneficiaram 105 mil pessoas e outras 48 mil, no primeiro semestre de 2021.

Pensando em impactar as comunidades onde estamos presentes, as unidades da Kroton, com a participação de alunos, professores e colaboradores, também promovem ações que contribuem com o desenvolvimento desses grupos, aproveitando nossa capilaridade para ampliar nosso impacto no Brasil. Temos, ainda, atendimentos de Fisioterapia e Psicologia, para pacientes pós-covid, além de serviços de Nutrição, Odontologia, Contabilidade/Administração e Direito. 

Consultas, avaliações e consultorias são realizadas pelos estudantes, supervisionados por professores e coordenadores dos cursos. Esta iniciativa contabilizou mais de 640 mil atendimentos em 2020, que representaram uma desoneração para os cofres públicos de mais de R$ 250 milhões.

Ainda temos muitos desafios e descobertas pela frente. Poder expressar minha visão deste momento é precioso para minha carreira. Fico feliz em ter a chance de refletir sobre pontos importantes no futuro das IES e contribuir neste espaço criado pela Minha Biblioteca. Meu sincero desejo e expectativa é que os acadêmicos se unam, ainda mais, em um mesmo objetivo.

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