As habilidades interpessoais – inseridas nas soft skills – já se tornaram um diferencial dos profissionais, de qualquer área do conhecimento, para o mercado de trabalho. Essas competências, diretamente relacionadas à inteligência emocional, ganham cada vez mais relevância e espaço na formação acadêmica e no processo de aprendizagem das IES (Instituições de Educação Superior), que prezam pela qualidade do ensino e estão conectadas às demandas do mundo do trabalho, em constante transformação.
O que se discute é que o desenvolvimento das soft skills no Ensino Superior contribui para que os estudantes sejam mais competitivos profissionalmente e prósperos no âmbito social, sendo gestores de suas emoções. Adaptar-se para estabelecer relacionamentos saudáveis é condição fundamental para a construção de um projeto de vida e o delineamento de uma carreira de sucesso.
Segundo Vânia Marques Leite, Coordenadora da Área de Formação de Professores da Ânima, nas instituições do Grupo, os currículos são integrados e orientados para o desenvolvimento de competências permitindo a máxima conexão com a realidade social e o mundo do trabalho.
Na entrevista que concedeu ao Blog da Minha Biblioteca, Vânia destaca ainda que “a Educação é um terreno fértil à mobilização e desenvolvimento destas habilidades, desde que as experiências de aprendizagem desafiem os discentes a colocarem estas competências em movimento”. Confira.
MB – A Educação 5.0 fala muito de soft skills. Como as habilidades interpessoais dos estudantes se inserem neste contexto, se pensarmos no foco da resolução de conflitos e de relações de confiança?
Vânia M. Leite – Os avanços das tecnologias digitais de informação e comunicação têm provocado uma verdadeira transformação na cultura, nas relações humanas, nas formas de consumo e de aprender. No mundo do trabalho, esta mudança tem como uma de suas principais características a substituição da atividade humana pela automação e inteligência artificial. No entanto, há algo que a tecnologia não pode substituir: a empatia, a capacidade humana de “ler” as emoções do outro, identificar e gerenciar seus próprios sentimentos e emoções.
Nós somos seres essencialmente afetados pelo outro, como também o afetamos, com as nossas emoções, sentimentos e nossa forma de ser. É no âmbito das relações interpessoais que os impactos da tecnologia têm nos desafiado a olhar para o que há de humano em cada um de nós. As habilidades interpessoais são trazidas na Educação 5.0 como possibilidade de construção de relacionamentos saudáveis, cooperativos, éticos, e que resultem na construção de uma sociedade mais feliz, que saiba usar a tecnologia de forma saudável e produtiva.
MB – As soft skills estão ganhando, de fato, espaço no ambiente de ensino? Isso pode ser um diferencial para os estudantes?
Vânia M. Leite – Essas competências socioemocionais são construídas ao longo da experiência de vida e, apesar de se constituírem como características intrínsecas à personalidade, o seu desenvolvimento dependerá das oportunidades e experiências vividas pelo indivíduo.
Nesta perspectiva, a Educação é um terreno fértil à mobilização e desenvolvimento destas competências, desde que as experiências de aprendizagem desafiem os estudantes a colocarem estas competências em movimento.
Acredito que não se ensina habilidades socioemocionais de forma direta. Por exemplo, não existe a possibilidade de ensinar alguém a cooperar ou a se comunicar, simplesmente dizendo o que precisam fazer. Em vez disso, a instituição deve criar situações em que os estudantes precisem trabalhar cooperativamente em grupo, ter uma escuta ativa, comunicar-se para interagir etc. Aprendo a colaborar, colaborando, aprendo a me comunicar, tendo que fazer isso de diversas formas e com diferentes recursos, e assim por diante.
Essas competências são aspectos transversais à formação, que devem ser mobilizadas pelos educadores em todos os contextos de aprendizagem. A escola pode, sim, contribuir para o desenvolvimento dessas competências, trazendo a dimensão atitudinal para a avaliação, ajudando o estudante a refletir sobre suas atitudes e seus sentimentos, autoavaliando-se, traçando objetivos para se tornar uma pessoa melhor, para si mesmo e para a sociedade.
Com isso, acredito que sim, a escola será capaz de preparar melhor o futuro profissional para os desafios do mundo do trabalho. Uma importante contribuição das instituições na formação do estudante é possibilitar que ele seja protagonista de sua aprendizagem, para que possa ser capaz de aprender e se desenvolver continuamente – chamado de LifeLong Learning.
MB – Quais destas habilidades você considera as mais importantes?
Vânia M. Leite – Todas aquelas que contribuem para vivermos melhor, num mundo extremamente acelerado e competitivo, incerto, líquido, fluido e mutável, onde a tecnologia é capaz de aproximar, mas também pode distanciar as pessoas de seus propósitos, da capacidade de observar e refletir sobre sua existência e os valores universais a serem preservados para o bem-estar da todos.
A capacidade de responder de forma adequada aos desafios da vida e da carreira profissional, de se adaptar a mudanças, de trabalhar em equipe, de se comunicar, de cuidar de si e dos outros, de tomar decisões, resolver problemas e conflitos, postura ética e respeito à diversidade, são algumas habilidades interpessoais/sociocomportamentais que considero de fundamental importância para qualquer profissional.
MB – Como acredita que as IES poderiam colocá-las em prática no dia a dia do ensino-aprendizagem?
Vânia M. Leite – O projeto de formação da escola deve valorizar os conteúdos atitudinais em seu currículo. Pode também desenvolver programas que potencializem, por meio do engajamento dos estudantes, estas soft skills.
MB – E os docentes, de que forma precisam ser preparados para estimular essas soft skills?
Vânia M. Leite – Este preparo é algo que se constrói a partir do que chamamos de conhecimento experiencial. O professor é o mediador do processo ensino-aprendizagem e se insere numa relação de liderança com os estudantes, tendo sua autoridade outorgada por eles. Ou seja, é no modo como se estabelece esta relação que o docente passa a ser validado e autorizado pelos discentes.
Isso significa que não é somente por aquilo que ele sabe, mas por quem ele é e como se comporta com seus estudantes. O exercício da docência exige a capacidade de refletir continuamente sobre sua prática, de conhecer a si mesmo e possuir habilidades como capacidade de escuta, de resolução de conflitos, flexibilidade, comunicação e cooperação, dentre outras.
“A Educação Superior deve estar atenta às dores e necessidades da sociedade e criar soluções inovadoras que sejam efetivas para esses problemas. É onde a inovação social ocorre”
MB – A capacidade de nos relacionarmos de forma equilibrada e a percepção de que precisamos do outro contribuem de que forma para preparar o estudante do futuro?
Vânia M. Leite – Contribui para que todos se vejam como parte de um todo, numa perspectiva sistêmica em que a relação entre as partes deste todo (nós, seres humanos) é de interdependência e corresponsabilidade. A maior contribuição é a construção de uma consciência do nosso papel no mundo, de uma ética universal, um profissional e cidadão consciente dos problemas globais que ameaçam a existência humana e comprometido com a sustentabilidade.
MB – Na sua análise, quando se comenta sobre inovação educacional no ensino superior, se refere apenas às novas tecnologias ou, neste contexto, se inserem a promoção do desenvolvimento e reforço de soft skills?
Vânia M. Leite – Inovar é mais do que incorporar novas tecnologias às práticas educativas. O sentido da inovação se inscreve na capacidade das IES serem criativas, disruptivas, de compreenderem com profundidade o que este cenário social tem apresentado como desafio, mas preservando os princípios e valores humanitários. A Educação Superior deve estar atenta às dores e necessidades da sociedade e criar soluções inovadoras que sejam efetivas para esses problemas. É onde a inovação social ocorre.
Os projetos que engajam os estudantes na resolução de problemas sociais é uma excelente via de construção de competências socioemocionais. A ideia não é competir, é ser competente para resolver problemas em contextos profissionais e situações diversas. Neste sentido, um profissional competitivo é aquele que é mais competente.
MB – Existem projetos nesse sentindo na Ânima?
Vânia M. Leite – Sim. Em nossas escolas os currículos são integrados e orientados para o desenvolvimento de competências permitindo a máxima conexão com a realidade social e o mundo do trabalho. Sua forma de organização promove a convivência dos nossos estudantes em diferentes comunidades de aprendizagem, o que potencializa as habilidades interpessoais e aproxima a experiência acadêmica da dinâmica social e profissional.
Ao longo do seu percurso formativo, o discente personaliza sua trajetória transitando por diversos projetos e programas do nosso ecossistema, em que se destaca o estímulo às competências socioemocionais/sociocomportamentais, tais como as jornadas empreendedoras, a mentoria, as unidades curriculares duais, os projetos de extensão, programa de internacionalização, anima hub, core curriculum, internacionalização, dentre outros.
A personalização é o meio pelo qual as individualidades dos nossos estudantes, suas preferências, suas formas de aprender e seus ritmos podem ser acolhidos, assim como suas dificuldades também acolhidas e solucionadas.
Logo no primeiro semestre do curso, já ingressam no Programa Vida & Carreira, cursando um componente curricular voltado ao autoconhecimento e desenvolvimento de soft skills. O objetivo é acolher e ambientar o estudante à vida acadêmica, ajudando-o a se conhecer melhor, a entender o seu papel no mundo e a manifestar habilidades para autogestão do seu projeto de vida e planejamento da sua carreira profissional.
MB – Qual a expectativa dessas competências se tornarem um instrumento essencial na formação dos estudantes, sendo uma das prioridades nas IES? Este futuro é próximo e viável?
Vânia M. Leite – Este futuro é o agora. É viável e necessário. As habilidades interpessoais e socioemocionais e sua importância na formação dos estudantes já não são uma discussão nova em outros lugares no mundo. Grandes universidades no exterior já transformaram os seus currículos para acolher esta dimensão humana na formação, que tem se apresentado cada vez mais urgente.
*A opinião do entrevistado (a) não expressa, necessariamente, o posicionamento do Blog da Minha Biblioteca.
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